O Aleph de Borges e o Apocalipse de João
Contando a experiência com o indescritível naquele é que é o seu melhor conto, o Aleph, Borges nos recoloca no problema que pode refletir o próprio problema do visionário João do Apocalipse. Ele escreve:
“Toda linguagem é um alfabeto de símbolos cujo exercício pressupõe um passado que os interlocutores compartem; como transmitir aos outros o infinito Aleph, que minha temerosa memória mal e mal abarca?”
Relembrando os místicos, ele sabe que poderia usar uma imagem equivalente.
Mas também que “este relato ficaria contaminado de literatura”.
Exatamente o que o Apocalipse é. A revelação de uma experiência sem passado, contaminada de literatura.
Como a experiência do Aleph, também a visão de João é a visão de um ponto que contém todos os outros. A história condensada.
Como num abrir e fechar de janela, ele viu tudo. Como contar isso? Mesmo é seu dilema:
A enumeração de um conjunto infinito. A eternidade num instante.
Um “instante gigantesco”, onde se vê “milhões de atos”, onde ocupavam “todos o mesmo ponto, sem superposição e sem transparência. O que viram meus olhos foi simultâneo; o que transcreverei, sucessivo, pois a linguagem o é.”
Viu tudo o que vê, todos os ângulos, a Verdade infinita sendo comida, uma grande Ceia universal. Ao dizer que, no Aleph, viu o universo embalado, Borges diz que viu a engrenagem do amor.
Borges explica o Apocalipse.